O que não mata engorda
03/10/12 03:00Em seu restaurante Pujol, no México, Enrique Olvera serve banana podre. Ou, como prefere chamar no menu, “banana do domingo passado”, com raspas de noz macadâmia e menta. Usa também um vinagre de bananas que fermentaram por 23 dias. Às vezes, a linha entre o pútrido e o saboroso é tênue e subjetiva.
Se soa repugnante, nem queira pensar em provar o prato de cordeiro com alecrim do Coi, em San Francisco. Leva garum, um condimento líquido, escuro, com cheiro bem forte e peixoso, muito usado na Roma antiga. O chef-proprietário, Daniel Patterson, também anda pesquisando fermentações —daí a ideia de fazer seu próprio garum.
O ser humano sempre consumiu fermentados, de vinhos e cervejas a shoyu, queijos, embutidos e pães. Ao longo dos séculos, descobriu-se como domar cada fermentação, aperfeiçoando-se métodos. Mas faltou perguntar os porquês. Por que o queijo brie do João sai diferente do da Maria, se são feitos da mesma receita? Por que um pinot noir argentino difere de um francês? Porque são alimentos vivos, onde habitam bactérias que os transformam.
“São os micróbios que caracterizam cada terroir”, diz David Chang. Dono dos restaurantes Momofuku em Nova York, Sydney e Toronto, ele é outro chef de renome que resolveu dedicar-se a pesquisar a microbiologia. “É aí que está o futuro da gastronomia. Nós, chefs, estamos buscando manipular sabores. E sabores resultam de como micróbios e comidas interagem”, diz. Cientistas de Harvard vêm ajudando Chang nas experiências com fermentados, inclusive variações do kimchi, prato de repolho fermentado típico da Coreia, de onde vêm os pais dele.
Como diz o recém-publicado livro “The Art of Fermentation”, a fermentação é um potencializador de sabores. Os resultados ofendem certos paladares. Mas, na maioria dos casos, estão embrenhados no gosto popular. Sem queijo, vinho ou pão, meio mundo padeceria.
PS. Chang, Olvera e Patterson virão palestrar em novembro no Semana Mesa SP, do qual fiz a curadoria de chefs norte-americanos.