Escondidinho é melhor
05/11/14 02:00Modas, na gastronomia, não se aplicam somente à comida, como também ao modo como ela é apresentada. Nos anos 1960, chefs franceses famosos rebelaram-se contra o luxo-ostentação em voga (porções fartas, muito molho). Lançaram a nouvelle cuisine, clean e leve, com guarnições coloridas e milimetricamente compostas.
De lá para cá já vimos de tudo um pouco. Uma das modas cuja morte eu festejei era o que se poderia se chamar de “cozinha-da-erva-espetada”. Nos anos 1980, era chique espetar ramos de alecrim ou tomilho em tudo o que era prato. Durou ainda mais tempo a onda torre de Pisa: elementos empilhados um sobre o outro.
Ainda vejo muitas torres de Pisa por aí, mas o visual tornou-se démodé uns dez anos atrás, quando chefs descobriram os pratos-que-não-são-pratos. Passaram a servir comida sobre madeira, mármore, azulejos e ardósia. A ardósia, em especial, virou febre pelo mundo afora.
Passaram para outra quando a fama do dinamarquês René Redzepi alastrou-se e seu restaurante Noma foi eleito o número um do mundo. Subitamente, o cool era servir à maneira nova-nórdica, em cerâmica rústica em tons apagados, os ingredientes dispostos assimetricamente. Ele lançou também os legumes servidos quase do jeito que saíram da terra (alho-poró com raiz, por exemplo).
Esse visual segue vivo e forte. Mas os pontas de lança já estão em outra: o escondidinho. Há dias, no D.O.M., engoli de uma bocada uma deliciosa ostra que nem sequer vi: um finíssimo wafer de manga a cobria. O dinamarquês Christian Puglisi é craque nisso. Ele cobre um purê de tupinambo com flocos de quinoa e pó de café. O chef Dan Burns, do Luksus, no Brooklyn, em Nova York, também gosta de brincar de esconder. Seu crudo de vieira e ouriço do mar só se revela ao partir com o garfo um véu de pão escuro tostado.
Dos estilos de montar prato, prefiro esse, porque o elemento-surpresa gratifica e diverte. Só perderá a graça quando, como toda moda, alastrar-se em demasia.