Albert não é o melhor por acaso
21/05/14 02:00Acabo de voltar de Toronto, no Canadá, onde fui participar do simpósio de gastronomia Terroir. Era a fórmula já conhecida: chefs mais e menos famosos subindo ao palco para palestrar, cozinheiros e estudantes na plateia.
Falou-se principalmente sobre aquele “ingrediente” crucial para o sucesso de um restaurante, mas raramente lembrado: o ser humano, do garçom ao fornecedor de ovos. David Chang (Momofuku) e Daniel Boulud (Daniel), vindos de Nova York, nos EUA, abordaram o tema.
Mas se algo me impactou foi a apresentação de Albert, irmão caçula (e ainda mais brilhante) do chef-celebridade Ferran Adrià, do extinto e mítico restaurante El Bulli, na Catalunha, Espanha. Justo ele, principal atração do evento, que poderia ter apenas subido ao palco, dito umas palavrinhas e colhido aplausos, foi quem mais se esforçou para ensinar algo inédito e relevante.
Trouxe um baú de ingredientes de Barcelona. Passou o dia na cozinha preparando tudo. E demonstrou como fazer mais de 12 fascinantes “pratos” –ou bocados, para ser mais precisa– de seu restaurante 41°, que é um dos sete melhores da Espanha.
Adrià vai mudar o jogo quando reinaugurar o 41° em setembro, depois de reformas. Em vez de trocar os pratos a cada serviço, servirá quase tudo sobre um mesmo retângulo de cristal branco, que ficará à frente do cliente durante o jantar.
Sobre essa “mesa”, como ele a batizou, a comida será depositada e finalizada na frente do cliente, levando a cozinha para dentro do salão. Um tomate, especialíssimo, praticamente nu. Um pepino, levemente temperado com kimchi, a conserva coreana.
O ingrediente como protagonista e sem disfarces. A cada intervalo, o garçom limpará a “mesa para que o menu prossiga, como nas degustações servidas em balcões japoneses.
A cada vez que o vejo dando banho nos colegas eu penso que nada acontece por acaso. Se Adrià é um dos maiores do mundo é porque reúne duas qualidades que rarissimamente vejo em um só chef: devoção cega ao trabalho e genialidade.