Chef Heston Blumenthal do The Fat Duck abrirá restaurante em Heathrow
12/11/13 15:22Quando recebi o press release, hoje cedo, a primeira coisa que me veio à cabeça foi: “até tu, Brutus?”
Dizia assim:
Heston Blumenthal e Heathrow estão falicíssimos de anunciar que o chef multi-priemiado lançará um novo restaurante no Terminal 2 (The Queen’s Terminal) em junho de 2014.
Ainda mantido em sigilo, o novo restaurante (…) focará no amor de Heston pela nostalgia e celebrará seu orgulho de tudo o que é inglês, inclusive nossos muito amados pratos de família”.
(…) ‘É um projeto incrível’, explica Heston. ‘Há tantos elementos diferentes a se considerar quando as pessoas viajam. Queremos entregar uma vasta gama de pratos familiares e fáceis, de fish and chips a pizza”.
Ceus.
Não digo que não será ótimo: Heston não dá ponto sem nó. E o aeroporto de Heathrow está caprichando na construção desse novo Queen’s Terminal, mais detalhes aqui.
Mas digo que esse chef mudou muito, como pessoa, desde que ficou rico e famoso. Foi-se o desdém pelas coisas materiais. Foi-se a dedicação monástica ao pequenino Fat Duck.
Quem te viu, quem te vê, Heston…
Quem ouve contar a história da ascensão meteórica desse chef acha que é lorota. Difícil mesmo acreditar que um rapaz tímido do interior da Inglaterra possa ter se tornado chef auto-didata, aberto o pequenino restaurante The Fat Duck sem experiência prévia para então conquistar num intervalo de tempo recorde – seis anos – a cotação máxima de três estrelas no guia Michelin. Isso sem falar na infinidade de prêmios que ganhou, culminando em 2005 com o título de Restaurante número 1 do mundo, que lhe foi conferido pela revista inglesa Restaurant (naquele ano o El Bulli de Ferrán Adrià ficou em segundo lugar). Hoje, é das maiores celebridades da gastronomia mundial, graças em boa parte aos seus programas de tevê.
Destemido, quando não era ninguém Heston conquistou a crítica e o público servindo pratos até então inéditos, como uma bolota de espuma de limão e chá verde “cozida” à mesa num pote fumegante de nitrogênio líquido, e sorvete de torrada com sardinha.
Heston fez tudo ao contrário do que rezam os manuais. Ao invés de estudar gastronomia, sua paixão, foi ser vendedor de máquinas de Xerox. A única tentativa de trabalhar num restaurante foi um estágio de menos de um mês no excellente Manoir Aux Quat’ Saisons, em Oxfordshire (onde ficou muito amigo de Marco Pierre White, que trabalhava lá e veio a se tornar um dos maiores chefs da Inglaterra).
Heston tinha dezessete anos e assustou-se com a experiência. “Ainda lembro do choque que foi para mim”, diz. “Aprendi que cada cozinheiro é uma peça numa grande linha de montagem e que ninguém prepara um prato do começo ao fim”.
Quando eu o conheci, em 2005, espantei-me com sua simpatia e modéstia. Jantei sozinha no The Fat Duck e depois ele me ofereceu carona de volta à minha modesta pousadinha. No caminho, fui fazendo perguntas, e continuei a entrevista na manhã seguinte, em seu laboratório.
Ele tinha um único terno no armário, presente de uma revista masculina. Viajava pouco, trabalhava muito. E tinha uma energia incrível, que parecia grande demais para caber dentro dele e de sua rotina. Vontade de experimentar o novo, de quebrar regras na cozinha, de falar de comida e das reações desencadeadas por ela, sem parar, sem parar, sem parar.
Em suma, aquele Heston – e o Heston que fui conhecendo melhor ao longo dos anos – é tudo o que menos se encaixa na minha visão de um terminal de aeroporto.
Mas ele sabe o que faz. E como já cantava Liza Minelli em Cabaret, money makes the world turn around.
E mais Heston Blumenthal:
Heston Blumenthal e a rejeição ao avanço: coluna no COMIDA
Meu almoço no Dinner, o restaurante de Heston Blumenthal em Londres