Um cafezinho com Alain Ducasse
04/09/13 03:00Faço parte do júri que elege anualmente os supostos 50 melhores restaurantes do mundo, mas não confio nada no resultado do ranking.
Comi muito melhor no número 26 (Quique Dacosta) do que no número quatro (Mugaritz) e não vi muita graça no Dinner by Heston Blumenthal, que está na sétima posição —para citar dois de muitos exemplos de quanto diferem os meus vencedores dos agraciados pela lista. Só concordo com o atual número um: o Celler de Can Roca não tem par.
Já o “Michelin” é outra coisa: se diz que um tal lugar merece três estrelas (a cotação máxima do guia francês) e o vizinho, apenas duas, provavelmente tem razão.
Infalível, não é, mas de modo geral o “Michelin” distribui estrelas com rigor e bom grau de objetividade. Por isso continua poderoso e influente. E por isso chefs descabelam-se na febril caça a elas.
Não há chef no mundo mais famoso pelas estrelas “Michelin” que conquistou do que o francês Alain Ducasse, cujos 27 restaurantes têm 17 delas. Foi o primeiro da história a ser dono de dois três-estrelas (um em Monte Carlo e outro em Paris) e hoje tem, além desses, um terceiro com a cotação máxima, no hotel The Dorchester, em Londres.
Chocou-me a declaração dele na semana passada, ao se apresentar no simpósio gastronômico MAD, em Copenhague: “Estrelas não são importantes, o que importa é a relação com clientes e com fornecedores”.
No dia seguinte, tomamos um café e pressionei: “Você não pode estar falando sério quando diz que não liga para estrelas ‘Michelin’, né?”. Sorrisinho maroto. E ele: “Fui sincero, acho que, se você faz seu trabalho bem, as estrelas vêm”.
Insisti, lançando um olhar cético. Aí, veio a verdade. “Claro que, quando eu comecei, as estrelas eram minha obsessão. Ajudam muito na carreira. Hoje, ligo menos. Quis dizer que é possível sobreviver sem elas.”
Sobreviver, quiçá. Mas na Europa, pelo menos, chef nenhum chega muito longe sem, no mínimo, duas das tão cobiçadas estrelas que fizeram de Ducasse uma lenda.