A caipirinha vai à mesa
17/10/12 03:00Dizem que beber cachaça deixou de ser visto como algo jeca. Mas até hoje sinto garçons brasileiros titubearem quando peço uma caipirinha de aperitivo. “De vodca, senhora?”, costumam perguntar, desacostumados a moças cachaceiras.
Cantamos as glórias do drinque nacional quando temos visita de fora, mas ainda não noto um verdadeiro encantamento por ele entre os habitués de restaurantes finos.
Em viagens, não só encontro estrangeiros cujos olhos brilham ao contarem das últimas caipirinhas bebidas como as vejo em menus-degustação com crescente frequência, em releituras do coquetel.
O melhor jantar da minha vida, em solo americano, foi sete anos atrás no pequenino Minibar, em Washington. A mirabolante sucessão de bocados imaginada pelo José Andrés, espanhol radicado nos Estados Unidos, iniciou-se com uma “esfumaçante” caipirinha, cuja cachaça tinha sido congelada em nitrogênio líquido e servida em taça de martíni.
O Minibar, aliás, reabre no dia 2 de novembro, reformado.
Andrés até hoje serve falsas caipirinhas, agora rebatizadas de “LN2”: referência à banheira de nitrogênio líquido que é levada à mesa do cliente para mergulhar nele o drinque, obtendo assim uma espécie de “sorbet bêbado”. Seu mentor Ferran Adrià, do mítico e extinto restaurante El Bulli, na Catalunha, também já brincou de mudar sua textura, servindo bastõezinhos de cana-de-açúcar embebidos em caipirinha, para chupar e mascar.
Martin Berasategui, o premiado chef do restaurante homônimo, no País Basco, tem agora um prato de melão com caipirinha no menu.
José Avillez, reputado chef português, surpreende os clientes em seu restaurante Belcanto, em Lisboa, com um “amuse bouche” esférico e verde-escuro: caipirinha sólida!
Em São Paulo, ela até virou macaron nas mãos do pâtissier Flavio Federico, e, por obra da chef Bel Coelho, foi parar em cima de ostras, no menu do Dui. Nossa feliz trinca açúcar-limão-cachaça é camaleônica e vem saltando do copo à mesa nas mais inesperadas encarnações.